CICLOVIA NÃO É “COISA” DO PT
Ultimamente virou hábito partidarizar toda e qualquer ideia, classificando qualquer proposta
Simplifica-se
o debate, mas sufoca-se os argumentos, tudo vira bate-boca de torcida, divide a
sociedade em guetos, atropela-se as ideias.
É o
que está acontecendo com o “debate” sobre as ciclovias em São Paulo.
Parece
que todo mundo que anda de bike ou é favor das ciclovias é petista e eleitor do
prefeito. Quem tem qualquer reparo as ciclos, ou anda de carro é do PSDB,
coxinha desnaturado. Tudo errado.
Os
buracos, inclusive das ciclovias, são bem mais embaixo.
O
debate acirrou recentemente, com uma interferência do Ministério Público
Estadual, que paralisava todas as obras cicloviárias da cidade, argumentando
falta de planejamento, o que é verdade, mas nem tanto. A Prefeitura conseguiu
derrubar a liminar e o alcaide comemorou a decisão com ares de quem tinha
vencido uma grande batalha e insinuando que estava tudo certo com os 262 km de
ciclovias implantadas, um pouco mais da metade da sua meta de dotar a cidade
com 400km de vias exclusivas para as bikes e deixar acertados mais de 1.400 km
para o próximo prefeito, seja lá qual for.
Ninguém
em seu juízo perfeito é contra as ciclovias, mas a Prefeitura, como quase todo
mundo nesse país, não gosta das críticas relacionadas ao modo como vem
implantando dita cujas. Do outro lado tem gente disposta até a recorrer a
polícia, contra as ciclovias, apelidando o prefeito de Suvinil, acusando-o de
autoritário e de não ouvir a população. E ainda veem as bicicletas como uma
ameaça a segurança das suas moradias e negócios.
São
várias coisas que não estão sendo levadas em conta no debate, que poderia ser
útil, se as ideias e argumentos, contra e a favor, não fossem atropelados pelo
falso “partidarismo” e radicalização dos argumentos. O primeiros deles é que as
bikes não vão substituir os carros, como a administração insinua muitas vezes.
O que fará as pessoas desistirem dos seus automóveis será – e unicamente – um
transporte público eficiente. Eficiente significa conforto, pontualidade,
flexibilidade, segurança e ganho de tempo. Sem oferecer isso as pessoas não
farão a mudança. As bikes oferecem tudo isso? Claro que não. Para começo de
conversa elas não são um modal de transporte em massa, mas uma alternativa e
precisam de uma complementação a ser oferecida pelos outros meios de
transporte. As estações de trens e metros precisam de bicicletários, por
exemplo, para aqueles que podem percorrer distâncias menores, nas bikes, mas
que não se dispõe, nem podem, atravessar a cidade nas magrelas.
Comerciantes
e moradores precisam ser convencidos de que ciclistas podem ser benvindos e
mais: instrumentos de uma cidade mais civilizada, amena e com lucros e
dividendos para o comércio. Isso foi feito em outras cidades e foi sucesso.
A
administração também precisa parar de criminalizar que anda de carro, afinal o
mesmo partido do prefeito, no governo federal, ofereceu, e ainda oferece,
inúmeras vantagens para quem desejar comprar um automóvel. Além disso, todas as nossas cidades foram
planejadas, durante anos e anos, em função do transporte privado. A estrutura
de todas elas, a organização, privilegia o carro em detrimento de todos os
outros modais. Como fazer com que a população abandone, repentinamente, esse meio
de transporte em função de ônibus caindo aos pedaços, com trajetos que só
beneficiam os donos das frotas, trens e metros superlotados, com passageiros
enfiados em verdadeiras latas de sardinha?
Discutir
as ciclovias como “coisa do PT” e tentar enfiar a pecha em quem anda de carro ou se diz contra
elas, como coxinha/classe média/reacionário não vai ajudar São Paulo a ter um
sistema de transporte melhor. Não faz mal lembrar que no programa de José
Serra, do PSDB, para concorrer a
Prefeitura também, incluía a construção de 400km de ciclovias, que o Gilberto
Kassab, sabe-se lá na época de que partido, iniciou a construção de várias
delas e que até o governo estadual é responsável por duas, importantes, nas
marginais.
Precisamos
das ciclovias. Sem boca de lobo, buraco, árvore, poste, poça d’água, falta de
sinalização, trajetos polêmicos e desníveis de asfalto. A Prefeitura poderia
encarar as críticas e fazer um trabalho melhor. Além de conversar mais com a
população e criar incentivos para o uso das bikes, fazendo parcerias com o
comércio, criando infraestruturas de apoio, como os bicicletários, por exemplo.
A
população precisa exigir meios de transporte melhores, com ônibus modernos,
trajetos racionais, mais trens e metro.
As bicicletas não são solução, nem a perdição, para o transporte em São
Paulo. Se todo mundo usar o bom senso, sem partidarismo e atropelamento de
ideias as ciclovias podem ajudar a transformar São Paulo numa cidade melhor,
mais humana, mais agradável de se viver. E ainda devolver para quem faz uso das
bikes uma nova perspectiva, um novo ponto de vista sobre a cidade. Ver a cidade
sob o ponto de vista do pedestre, promovendo o encontro das diferenças, nas
ruas, nas esquinas, retomando uma escala que o carro nos fez perder.
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