RECORTES DE DOMINGO
Ao folhear despreocupadamente o jornal de domingo me
deparo primeiro com Leandro Karnal a perguntar se eu seria capaz de identificar
as cinco datas mais marcantes da minha existência ou, pelo menos, o que
consegui no ano de 2016 e quais seriam os dias especiais, deste ano que já vai
indo. Lembrei de muitas, das mais marcantes de 2016 e bem mais de cinco da
minha existência, mas as deixei passar leves e prazerosas, deixando de lado as nem tanto, afinal, é só uma manhã de domingo.
Saltei de Karnal para Oscar Quiroga, que me instou a
assumir a minha liberdade, pois me “encontro no lusco-fusco entre o antes que
não é mais e o depois que ainda não é. Por isso, me diz, é importante assumires
tua liberdade e te movimentares com leveza, já que és maior que as
circunstâncias. Tudo que preciso fazer, me diz, é coordenar a minha vida
interior com a vida exterior. Mas adverte que e mais fácil dizer isso que
fazer.
Em outras páginas, quase que para responder a Karnal,
me deparo com Wanderléa, sim a “ternurinha tremendona”, que do alto dos seus 70
anos (oh, céus) está pronta para mostrar, em um musical, como ditou moda e
antecipou atitudes, nos anos 60, quando era ainda uma garota de 19 anos, a me
encantar no TV Record, com o Programa Jovem Guarda, ao lado de Roberto e Erasmo
Carlos.
Lembrei da Jovem Guarda, de Elis Regina, dos muxoxos
da esquerda que os classificava de alienados e até de uma passeata contra a
guitarra elétrica, com Elis, Gil e Edu Lobo de braços dados. Lembrei de como
curti tudo isso, da esquerda ao rock alienado. Como eram bons, ainda que sob a
ditadura esses anos.
E, provavelmente, mais influenciado por Quiroga e seus
conselhos presságios me deparo com um personagem, o Marcos Mion, que sempre
achei um idiota de carteirinha, a me comover e com isso lembrar em rever sempre
os conceitos que faço das pessoas. Mion está lançando um livro, inspirado em
Romeo, seu filho de 11 anos, e em um Natal em que ele lhe pediu, singelamente,
apenas uma escova de dentes azul de presente.
Romeo tem Transtorno do Espectro Autista (TEA) e Mion
conta, com graça, generosidade e muito amor, como ele e sua mulher, Suzana,
lidam com o cotidiano de Romeo e dos seus outros dois filhos, Donatela e
Stefano e, principalmente, sobre as lições que aprendeu com Romeo.
Já tinha decidido que eram muitas “lições de vida”,
para um simples folhear de um jornal domingueiro, quando resolvi dar uma
olhadinha final no Veríssimo, o que nunca faço. E lá está ele a, citando Millôr
(e tome recordações), conjecturar sobre um instante na vida de qualquer pessoa
em que ela pensa: nunca me senti tão feliz como nesse exato momento. E que, em
seguida, vem outro pensamento: nunca mais me sentirei como agora”. Sim, já vivenciei isso, mas assim como
Veríssimo, hoje, também “desminto a segunda parte da filosofia de Millôr”.
Assim como Veríssimo, sei/sinto que vivi muitos e muitos momentos de
felicidade. Se olhar direito, como propôs Karnal, para a minha existência,
descubro uma infinidade deles. E tenho certeza de que muitos e muitos outros
ainda virão, ao lado da minha mulher, que me tolera a nada menos que 25 anos,
dos meus filhos e neto, por enquanto este no singular.
E dei por visto. É muita coisa para um despretensioso folhear
de um jornal de domingo.
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