PESQUISAS X PESQUISAS – 72% X 17% DE INSATISFEITOS. É POSSÍVEL?


É possível. Tudo depende da pergunta. Vou me aproveitar aqui de um comentário de Cesar Maia, sobre esse mesmo assunto, que vale a pena. Na pesquisa do Pew Research, que comentei aqui no blog, sobre o título “Brasileiros irritados  com tudo e todos”, como de fato estão, revelava que 71% dos brasileiros se diziam insatisfeitos, contra apenas 26% de satisfeitos. Pesquisa do IBOPE, realizada apenas um mês depois, aponta, no entanto, um número muito inferior: apenas 17% estavam insatisfeitos, contra 71% de satisfeitos.

Algumas pessoas questionaram isso. Como é possível uma reviravolta desse vulto em apenas um mês de diferença? Um dos institutos errou grosseiramente? Nada disso, apenas perguntas bem diversas.

O Pew Research perguntou: Em geral, você está satisfeito ou insatisfeito com o modo como as coisas vão no seu país?
Já para o IBOPE a pergunta foi: Como o(a) sr(a) diria que se sente com relação à vida que vem levando hoje? Muito Satisfeito/Satisfeito, Muito insatisfeito/Insatisfeito.

Aparentemente são semelhantes, mas as pessoas vão responder de forma completamente diferentes às duas questões. O instituto americano queria saber a opinião das pessoas sobre o país, já a pergunta do IBOPE estava voltada para o sentimento das pessoas com relação a vida de cada uma delas.

O eleitor se “descola” nessas duas questões. Uma coisa é como ele vê o país, outra como encara a sua própria vida. O sujeito pode estar satisfeito com o modo como a sua vida pessoal está sendo tocada, mas pode ter um grau de insatisfação muito grande com o modo como as coisas estão feitas no país e vice-versa.

Por isso é preciso muito cuidado na hora de interpretar e tirar conclusões de resultados de pesquisas sem considerar/conhecer as perguntas. E o que os candidatos poderiam aprender com os resultados, por exemplo, dessas duas pesquisas e ficarem mais atentos aos conteúdos?

Candidatos da situação devem se ater, prioritariamente, ao modo como os cidadãos veem as suas vidas, o grau de satisfação que estão tendo sobre o modo como elas estão sendo tocadas, obviamente. “Prometendo” o que for possível para que eles continuem satisfeitos e tentando “colar” a sua política/realizações nesse “estado de graça”. Por outro lado, vão ter que propor, paralelamente, um novo modo de conduzir o país, para tentar convencer esses mesmos eleitores, que votando neles  a insatisfação tende, pelo menos a diminuir. Requer cuidado e sutileza para não confundir as coisas, o que é frequente. Se pintar tudo com cor de rosa, o eleitor tende a se sentir menosprezado em sua inteligência. Um exemplo simples: o sujeito pode estar satisfeito porque consegue colocar comida na mesa e pagar suas despesas básicas. De certa forma está satisfeito com o modo como a sua vida está indo, mas – por outro lado – está insatisfeito com a saúde, as escolas e o transporte públicos. Ressaltar as conquistas é uma coisa, pode atrair simpatia, mas daí a dizer que está tudo indo muito bem é fazer o eleitor de bobo. Alguns até podem ser, mas todos, certamente não são. O sucesso do discurso está no equilíbrio e em distinguir uma coisa da outra.

Para quem está na oposição o recado é igualmente claro, mas inverso. No entanto um cuidado é essencial e na maioria das vezes não é levado em conta. As críticas a situação “externa”, que provocam um alto grau de insatisfação no eleitor, devem ser feitas de uma forma muito clara para que não pareçam um ataque ao modo como a maioria dos eleitores vê a sua própria vida, e com a qual a está satisfeita. Caso não atentem para o que parece apenas uma sutileza as criticas podem ser entendidas pelo eleitor como dirigidas à sua vida e não ao ambiente externo, sentindo-se agredido e rejeitando o candidato. Usando o mesmo exemplo acima: se pintar tudo com tintas pretas, inclusive desqualificando, ainda que indiretamente, a vida que o cidadão está levando, o eleitor vai se sentir igualmente criticado. Aqui é preciso ressaltar e prestigiar o que foi conquistado e acenar com perspectivas externas de melhora. Atacar o que gera insatisfação e “prestigiar” o que está sendo bom.

Nas duas situações é preciso equilíbrio e sutileza. Coisas que nem sempre são consideradas nas análises e discursos em época de eleição, quando a ansiedade e a leitura apressada dos sentimentos dos eleitores é quase uma unanimidade.

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