CHORO POR TI, POR MIM, ANGOLA QUERIDA.
Na década de 90 fui, com uma
equipe de cento e poucas pessoas, trabalhar em Angola, onde fiquei, em
intervalos, por dois anos. Recém saída, formalmente apenas, de mais de um
período de guerra, o país preparava-se para as suas primeiras eleições
democráticas.
Nunca havia estado em um país
em guerra. Ficamos todos chocados com o
que víamos: mutilados por toda à parte, a escassez de tudo, a pobreza e
principalmente com as crianças e jovens, pobres, famintos, sem perspectiva
nenhuma de futuro senão a guerra.
Acreditávamos em nosso
trabalho. A paz, finalmente alcançada, as eleições livres, a democracia, a
liberdade, a oportunidade de usufruir das imensas riquezas do país. A
possibilidade de um futuro, sem sofrimentos, próspero, feliz.
Jonas Savimbi |
Acreditávamos estar do lado
certo. Sob a liderança de um líder feroz e intransigente, Jonas Savimbi, o
“outro lado” nos parecia, e era, a representação do mal, de tudo que de pior
poderia acontecer.
Víamos, no semblante e na voz suave do nosso candidato, o
José Eduardo dos Santos, a verdadeira face da esperança e de dias melhores.
Choramos entristecidos, quando após a divulgação dos resultados das eleições,
as tropas da Unita se rebelaram e o conflito voltou ao país, não poupando sequer
a sua capital. Derrotada, militarmente, mais
tarde, a Unita decidiu aceitar o jogo democrático, participando inclusive de
eleições posteriores.
José Eduardo dos Santos |
O problema é que o dos Santos, decidiu tornar-se
presidente eterno de Angola, não desgruda do poder e preside hoje a pilhagem
sistemática do país, negligenciado o seu povo.
Houve melhoras? Sim. Mas um
país rico em diamantes, com petróleo farto, clima favorável, recebendo ajuda
significativa de várias potencias mundiais, entre elas Brasil e China, que
investiram maciçamente em Angola nos últimos anos não progrediu como deveria,
não proporcionou ao seus cidadãos a riqueza, a tranquilidade, a paz que eles
tanto merecem.
As mulheres angolanos,
guerreiras, que praticamente sozinhas mantiveram o país de pé durante todos os
longos anos de guerra, continuam vendo seus filhos morrerem, agora de fome,
vítimas da desnutrição, como bem chamou a atenção, Nicholas Kristof, em artigo
publicado no New York Times, que chamou
Angola de país mortífero para crianças. Crianças mortas pela fome,
“desnutridas, com membros semelhantes a gravetos, cabelo descolorido e pele
descascada”.
Enquanto isso, os ricos
angolanos esbanjam riqueza, circulando em carros milionários, com propriedades
espalhadas pela Europa, cujas fortunas foram, na maioria absoluta das vezes,
conseguidas às custas de negócios onde o Estado sempre entra beneficiando-os.
Isabel dos Santos |
Um dos melhores exemplos é a filha do presidente, a bela Isabel dos Santos,
cuja fortuna multiplicou nada menos que sete vezes, de 2012 a 2014, saltando de
500 milhões para 3,7 bilhões de dólares. Isabel é sócio de tudo o que interessa
em Angola e o Estado jamais se furtou de injetar recursos milionários nas
empresas que a filha mais velha do presidente comanda ou é sócia.
Os angolanos são um povo maravilhoso,
otimista, não importa o sofrimento, com uma crença impressionante num futuro
melhor que sempre lhes é negado. Primeiro pelo colonialismo português, depois
pelo envolvimento na guerra fria, que dividiu o país, aparentemente em duas
tribos, basicamente, mas que por trás delas estavam o bloco soviético e o
ocidente, financiando, estimulando uma guerra que tantas vidas custou àquela
gente.
A guerra acabou, mas não para
as crianças angolanas.
O país ocupa o primeiro lugar na taxa de mortalidade de
crianças até os 5 anos, uma em cada seis morre antes de completar essa idade.
25% delas definham vítimas da desnutrição generalizada. É fácil encontrar
crianças de 7 anos que pesam apenas 16 quilos, enquanto suas mães morrem de
parto, na proporção de uma a cada 35 mulheres.
Jose Eduardo dos Santos matou
as minhas esperanças, as minhas ilusões. Mas elas nada significam diante do
descaso com que trata o seu povo. Dos Santos tem hoje 72 anos, talvez não dure
mais, muito tempo no Governo. Oxalá esse povo sofrido consiga colocar em seu
lugar alguém que faça pelo país, pelas
crianças, pelas mulheres, pelos homens de verdade de Angola. E aí, quem sabem, as
mães angolanas, finalmente, não chorarão mais pelos seus filhos.
Comentários
Postar um comentário