LADRÃO DE GALINHAS CHEGA AO SUPREMO



Não, não é isso que você pensou. Mas nesta semana a Corte julgou um caso envolvendo o furto de duas (isso mesmo: duas) galinhas em uma cidade de Minas.  Causa perplexidade, pelo menos a mim, que a mais alta Corte do país pare para julgar um caso de tamanha importância (detalhes mais adiante). O que acontece com a nossa Suprema Corte? No momento em que o mais importante tribunal de um país debruça-se sobre a concessão de habeas-corpus para uma pessoas acusada de roubar duas galinhas, alguma coisa está errada, muito errada. E não para por aí. Em breve mais casos de alta relevância chegarão à Corte:

Furto, em suma casa, de um ferro de passar, um carregador de celular, um fone de ouvido e uma chave de fenda, entre outros objetos do mesmo quilate. Valor da causa: R84,89 – E outro furto, este em um supermercado, de seis barras de chocolate, cujo valor da causa está estimado em R$31,80. As galinhas custam no máximo R$40,00. Já o Supremo custa ao país nada menos que 500 milhões por ano.

Enquanto o Supremo se dedica a ladrão de galinhas, aguardam na Corte assuntos de pouco importância para o país, como a decisão sobre as perdas (milhões e milhões) na poupança decorrentes de planos econômicos, a descriminalização de drogas e o pagamento de precatórios, para ficar em alguns exemplos. Além de casos dessa magnitude, a Corte – transformada em mero tribunal de última instância – se vê hoje às voltas com uma quantidade gigantesca de outros sem a menor importância, que poderiam ter o seu desfecho nos tribunais “inferiores”.

Além disso, o Supremo tem dado sinais conflitantes na análise de vários casos (vide os mensalões do PT e do PSDB e mais recentemente a tal de operação Lava-Jato). Sem querer bancar “jurista de Facebook”, creio que a Suprema Corte deveria, como nos países desenvolvidos, se dedicar às grandes causas, aquelas que influenciam, que tem repercussões reais e importantes sobre a vida de toda sociedade.

Outra coisa é que devemos acabar de uma vez por todas com esse tal de foro privilegiado. Nos Estados Unidos, para ficar em um único exemplo, o presidente de uma das mais poderosas nações do planeta, é julgado por um tribunal comum, se cometer qualquer delito. Aqui, qualquer político ‘lequebrete’, mesmo que furte uma galinha, vai parar no Supremo. As razões, aventadas, de que nas primeiras instâncias os políticos poderiam sujeitos a percalços provocados por eventuais inclinações ou más intenções dos juízes não se sustenta. Acreditar nisso é o mesmo que decretar que todos os juízes das demais instâncias são corruptos ou corruptíveis. E, nesse caso, também não serviriam aos cidadãos comuns.

Tem ainda, uma tendência típica de republiquetas, da Corte interferir em qualquer questão, chegando ao ponto de desautorizar decisões de outros juízes, como aconteceu recentemente com a desastrada intervenção do recém chegado ao Supremo, ministro Teori Zavascki, que paralisou as investigações da Operação Lava a Jato, mandou soltar perigosos contraventores depois voltou atrás, revogando a soltura, embora tenha, estranhamente, mantido em liberdade um dos principais investigados, tudo sob a alegação de que existiam políticos envolvidos e que – por conta disso – o caso deveria ser prerrogativa da Corte Suprema. Por pouco, muito pouco, o ministro que por sinal não justificou a sua volta atrás, não prejudicou totalmente a investigação da Polícia Federal e o processo.

Casos como esse, com suas prováveis idas e vindas, cria insegurança nas instâncias inferiores. Além disso, ao aceitar processos que poderiam perfeitamente serem resolvidos pelos outros tribunais, o Supremo acumula uma enorme quantidade de casos, que aguardam anos e anos para serem julgados, o que de resto não é um problema exclusivo da Suprema Corte.

Fica claro que o sistema judiciário brasileiro precisa urgentemente de uma reforma radical. Ao Supremo o que é de maior importância para o país, nas demais instâncias os meios para que a justiça enfim seja ágil e cumpra o seu papel. Para isso precisamos que o Congresso se mova e atualize os nossos códigos civil e penal e que as nossas polícias sejam modernizadas e melhor treinadas. Ou seja, vai ser difícil, muito difícil, termos uma Justiça, com letra maiúscula, em breve. Infelizmente, mas é assim.

Por curiosidade: o caso das galinhas passou por todas as instâncias da nossa lenta justiça, devido ao fato do juiz, que analisou o caso, ter se recusado a conceder habeas-corpus ao ladrão, optando, também, pela pena de reclusão. A Defensoria Pública recorreu, alegando que afinal não se tratava de nenhum crime grave. Não haveria a necessidade de mover a máquina judicial, o aparato criminal judicial para reprimir essa conduta, alegou a defesa. No final das contas a Suprema Corte decidiu que se tratava, de fato, de um delito sem importância e que o réu sequer merecia maiores punições, contrariamente ao voto do ministro Marco Aurélio, que – embora concordando com a “pequenez” do delito – queria que pelo menos algum tipo de punição fosse dado, já que “crime”, de fato aconteceu. O debate, sobre questão tão fundamental, consumiu mais que parte de uma sessão, com os inevitáveis apartes, sua excelência pra cá, sua excelência pra lá, data vênia, citações de outros doutos juristas e por aí foi.

Vale ler as trecho da manifestação do ministro Fux, sobre o caso das galinhas. É muito português castiço gasto com os galináceos
Ao analisar o caso no STF, o ministro Luiz Fux decidiu aguardar o julgamento do mérito do pedido para decidir a questão definitivamente.
“A causa de pedir da medida liminar se confunde com o mérito da impetração, porquanto ambos referem-se à aplicabilidade, ou não, do princípio da insignificância no caso sub examine. Destarte, é recomendável que seja, desde logo, colhida a manifestação do Ministério Público Federal”, decidiu Fux.

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