DAMARES, LÉSBICAS, CACHORROS, CHOCOLATE, TUDO NUM SACO SÓ.


Quando a ignorância, a pobreza intelectual e a intolerância se misturam tudo tende a ficar pior.

E o que tem uma coisa a ver com outra? Aparentemente nada e tudo. Um bate-boca, onde entra Ministério Público, cachorros, desenhos animados, lesbianismo e chocolate, que tomou as redes nada têm com os fatos, mas com ideologia de boteco, más intenções e muita ignorância.

Cena do comercial da Havan, alvo do MP-SC
No fim de abril o MP-SC resolveu se intrometer em um comercial relacionado com a Páscoa, da Loja de Departamento Havan (sim, daquele grupo acusado de doações supostamente ilegais a campanha de Bolsonaro). No desenho animado coelhos oferecem um ovo de chocolate para um cachorro. Segundo o promotor de Justiça Marcelo Brito de Araújo, que intimou a empresa a prestar esclarecimentos, a propaganda seria abusiva por estar incitando “o oferecimento de alimentos prejudiciais a saúde dos animais domésticos”. Mais tarde o bom senso voltou e em nota o MP-SC informou que o pedido foi arquivado, após descobrir que a "alegação era descabida por tratar-se de desenho animado que desenvolve, em sua breve história, simples narrativa de humor."

Ficam, no entanto, algumas perguntas: fosse outra a empresa, que não uma pretensamente envolvida com a campanha Bolsonaro, teria o nobre promotor a mesma “preocupação” com a alimentação canina? É realmente função do MP se intrometer com propaganda de empresas, cujas mensagens, estritamente comerciais, não oferecem risco óbvio à sociedade, seja lá qual for a ótica que se use?

Mas o Festival de Besteiras que Assola o País, o FBAPA, criado pelo saudoso Sérgio Porto, o Stanislaw Ponte Preta, parece não ter fim.

Neste final de semana, viralizou um vídeo de 2018 (mais um) da ministra da Damares Alves, onde ela afirma que Elsa, a princesa de Frozen, um desenho de sucesso da Disney, é lésbica. Choveram críticas e mais críticas. Algumas hilárias, como as da Xuxa que, entre vários impropérios desferidos contra a ministra, lançou a pergunta: “Onde está o respeito pelo ser humano?”, esquecendo, talvez, o fato de Elsa ser apenas um personagem de ficção.

A ministra, como é por demais sabido, não prima pelo rigor científico dos seus comentários, nem pela originalidade das suas ideias, mas – neste caso específico – não está sozinha, ainda que a sua análise sobre o filme seja bem pobrinha

O psicólogo canadense, Jordan Peterson, bem mais sofisticado que Damares, fez um
Elsa, seria a primeira princesa lésbica da Disney?
estudo junguiano de Elsa como arquétipo,  e conclui que, na animação, há um desequilíbrio intencional criado para expressar uma ideologia unidimensional, e que Fronzen, por motivos ideológicos, sugere que as mulheres não precisam dos homens. Ops! Peterson foi sutil, em sua linguagem acadêmica, mas própria comunidade LGBT, não foi e comemorou a possibilidade de Elsa ser de fato “a primeira princesa lésbica da Disney”. Isso sem contar que a codiretora e roteirista do filme, Jennifer Lee, deixou no ar, no trailer Fronzen 2,  a possibilidade de Elsa vir a ter mesmo uma namoradinha.

Então, Damares não é certamente um modelo intelectual a ser seguido, e todo mundo tem direito de espinafrar qualquer ente público, principalmente pro ser público, mas neste caso especifico as críticas feitas a Damares são do mesmo quilate das habituais declarações da ministra. Isso é bom? Claro que não. Melhor se concentrar nas ações do ministério, fazer a boa política, prestar a atenção nos seus decretos e ações, pois discutir o gênero de personagens da Disney, ainda mais quando foram declarações feitas anteriores a gestão, não contribuem em nada para o avanço das políticas no âmbito do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos. Tem mais carne por baixo desse angu.

O problema é que nos últimos tempos ideologias de boteco têm sido o instrumento mais usado para analisar a realidade e, pior, tirar conclusões sobre os caminhos a serem trilhados pela sociedade. A pobreza intelectual, de ambos os lados, aliada às más intenções e a ignorância generalizadas estão nos levando a um radicalismo extremo, cujos danos severos ainda não temos condições de avaliar. Mas o futuro é sombrio.

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