Diário de uma quarentena – 02 A tensão e as preocupações aumentam.
Ontem o supermercado aqui do bairro informou que vai fechar as portas. Está com problemas de abastecimento e os funcionários estão se recusando a irem trabalhar, com medo de serem infectados por clientes e fornecedores. Ontem estava com o açougue estava completamente vazio e nas prateleiras muito espaços sem reposição. Os funcionários, que ainda estava trabalhando, queixavam-se do comportamento agressivo de alguns clientes, principalmente dos mais idosos. Parece que os mais velhos são os que estão criando mais problemas.
Esse supermercado faz parte da minha vida, do meu dia-a-dia. Conheço todo mundo: caixas, repositores, o pessoal da entrega... conversamos sobre nossas famílias, sobre a Bahia (sim tem uns dois ou três baianos), sou – como outros clientes habituais – tratado de forma preferencial, procuram mercadorias, escolhem as melhores frutas que eu preciso e por aí vai. Sem ele vou ter que enfrentar, quando necessário, e se possível, as grandes redes, que permanecem abertas. Conversando com o gerente ele me confessa que não sabem o que fazer. Queriam continuar abertos, mas ao que tudo indica não será possível. Também não fazem nenhuma ideia de como tratar a questão dos funcionários que se recusam a trabalhar. Demitir? Pagar indenização pra todo mundo? Continuar pagando os salários enquanto esperam por alguma solução, com o arrefecimento da crise? Por quanto tempo?
Imagino que seja uma situação que – aos poucos ou não – vai afligindo todo o médio e pequeno negócio nas proximidades. Ontem me dei conta de que terei que cortar o cabelo em casa, já que o camarada que me atende, vai fechar a barbearia. Como será que ele vai sobreviver a esses dias? Tem, por perto, alguns pequenos restaurantes e umas três ou quatro pizzarias, que vivem exclusivamente de entregas. Mas aqui no prédio - e quero crer que não apenas no nosso - as pessoas estão evitando, ao máximo possível, receber encomendas, temerosos de contágio.
No condomínio a tensão também aumentou. Ninguém quer circular nos elevadores com outras pessoas, os funcionários terceirizados fazem exigências (legitimas) para se protegerem, mas virou - de certa forma - uma queda de braço com a administração, também enrolada em dúvida e até mesmo sem material (de higiene e proteção. O fechamento de todas os equipamentos das áreas comuns também provocou tensão. Nada de sauna, academia, piscina, quadra de esporte, salão de festas, de jogos e churrasqueira. Nem todos concordaram com as restrições, mas elas serão mantidas.
A sensação que passa é um misto de medo, ansiedade e falta de perspectivas vai tomando conta de todo mundo. Como sobreviver a tudo isso? A questão não é apenas lavar as mãos, evitar aglomerações etc. Presos em casa precisamos inventar rotinas, dar conta das inevitáveis tarefas (fazer comida, lavar roupa, limpar a casa...) mas principalmente de encontrar formas de manter a convivência em níveis aceitáveis. É preciso muita calma para evitar conflitos e continuarmos tocando a vida de alguma forma.
Hoje pretendo espionar a fila de vacinação contra a gripe e quero muito ir na banca de revistas, que espero esteja aberta, para comprar cigarros (fumo os de palha e não são fáceis de encontrar). Pode parecer uma coisa bem menor. E de certa forma é, mas não acho que seja um bom momento para tentar parar de fumar. (rssss).
Vou ficando por aqui para negociar com os outros participantes do meu coletivo a saída para a vacinação e compras de cigarro. Enquanto isso espionar como anda a máquina de lavar.
Até o próximo.
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